sábado, 18 de junho de 2011

Dona Natália (curtos pensamentos para um grande carinho e gratidão)

Sempre ouvi dizer que a Dona Natália lá entrou em casa quando eu fiz um ano de idade. Naturalmente não me lembro. Mas lembro-me que desde que comecei a lembrar-me das coisas a Dona Natália estave lá. Sempre.



A Dona Natália lavou-me fraldas, cueiros e demais roupa (interior ou nem por isso).



A Dona Natália viu-me ir para o colégio. Foi levar-me buscar-me. A mim, petiz metido dentro daquele bibe que mudava de cor consoante o ano.



A Dona Natália viu-me ir para todos os graus de ensino. Viu o meu primeiro espalho de bicicleta e viu-me orgulhoso no primeiro dia que conduzi um carro.



A Dona Natália viu-me ir para a faculdade e lavou-me peças de roupa meio vomitadas depois de "sabatinas de estudo", especialmente ao fim-de-semana. Viu-me licenciado e viu-me sair de casa dos meus pais.



A Dona Natália, cuja história pessoal se funde com a nossa história naquela casa, desde sempre e até ao dia em que de lá saí, tratou-me por "menino".



Chegou a ser a causadora de eu me ter tornado alvo de chacota durante uns tempos. Depois de licenciado, já a trabalhar, mas ainda em casa dos meus pais, um dia toca o telefone. Uma chamada profissional. Perguntam pelo dr. Disse. Como sempre, e sem mácula, a Dona Natália responde: "Só um bocadinho, que vou ver se o menino já acordou".



A Dona Natália batia à porta do meu quarto de manhã. Perguntava se podia entrar e trazia-me o pequeno-almoço. Sempre o que eu mais gostava.



Nunca se esqueceu de um aniversário meu e sempre me oferecia qualquer coisa feita por ela.



Mas a idade limitou-lhe os movimentos e embora contrariada, decidiu que era hora de parar de trabalhar. De ir para sua casa. De descansar.



Faz agora dois anos que saiu.



Um dia destes fui almoçar a casa dos meus pais.



Quando saí do carro reparei que estava alguém nas traseiras do prédio, nas escadas para o terraço. A figura era-me familiar. Aproximei-me. Era a Dona Natália. Sentada nas escadas chorava.



Que se passa Dona Natália?



Ó menino que não quero que me veja assim. Ó menino que cada vez que aqui passo não me aguento e choro. Ó menino que saudades. Ó menino que infelicidade já não poder trabalhar. Ó menino que vocês me fazem tanta falta.



E eu sentei-me nas escadas ao lado da Dona Natália. E abracei-a.



Obrigado, Dona Natália. Por tudo.

A passadeira central

Chegaram assim. Sem aviso. Numa plácida e queda Quinta-feira. Máquinas, tubos, pedras, camionetas e camiões, tractores, contentores e afins. Tudo aqui à frente de casa. Tudo aqui na "praceta", tudo aqui na "quinta".

O burburinho cedo começou. Que se passa? Que se passará? Que vão fazer aqui? O mistério adensava-se à medida que os dias iam passando e cada vez se via mais parafernália. Gente... nada. Veio o fim-de-semana. Nada.

Veio a Segunda, veio a Terça, a seguir a Quarta e a Quinta... nada.

Veio a Sexta. E com ela cartazes. "Obra a cargo da Junta de Freguesia". Por baixo um desenho técnico das obras que se iniciariam e que todos foram ver. Uns juravam a pés juntos que seria um jardim. Outros garantiam que aquilo era um fontanário. Outros um parque infantil. Outros, mais cautelosos, aventavam que seria "uma merda qualquer".

Uma semana e meia depois começavam os trabalhos.

Com uma precisão mecânica suiça, impreterivel e impressionantemente, chegavam todos os dias entre as oito e meia e o meio-dia menos um quarto. Ao meio-dia paravam.

Dois africanos, um magrebino e um europeu de leste.

Se chovia, paravam os trabalhos para se abrigarem da água.

Se estava sol, paravam os trabalhos para se abrigarem dos mortíferos raios solares.

Se estava nublado, paravam os trabalhos para se abrigarem da depressão.

Feliz ficou o dono do café da esquina que no período da manhã começou a aviar não só os sempre monótonos cafés, mas as fresquinhas "mines" que saiam ora à cadência dos raios de sol ora à cadência das gotas de chuva. Ou disfarçadas na bruma.

Muitas vezes também os quatro trabalhadores viam-se forçados à incrível e cruel injustiça de terem que levantar o recto do tabique e correrem(!!!) para a obra porque vinham os 8 coletes amarelos que por uma hora os cercavam. Dois representantes da Junta, um representante da Cãmara Municipal, um arqueólogo, um engenheiro, o "dotôr", um fiscal camarário e um tipo que ainda que com colete amarelo e capacete enterrado nos cornos, nunca fez outra coisa senão estar ao telemóvel.

A coisa durou 7 semanas.

Na oitava semana apareceu a grande placa: "Passadeira Central".

Pois foi. Dois meses e uns valentes milhares de Euros depois, surgiu uma passadeira/lomba de proporções himalaicas em calçada e alteração dos parqueamentos. A "passadeira central" liga nada a coisa nenhuma. Nem os cães lá passam. Perderam-se mais de 15 lugares de estacionamento. O camião do lixo já não consegue passar. O camião da reciclagem já nao vem. Os carros mais baixos batem no asfalto se vão a mais de 3 Km/h.

Mas estamos muito mais felizes. Podemos morrer em paz.

Temos uma passadeira central.

segunda-feira, 6 de junho de 2011

O Regresso

E agora que novos ventos de mudança sopram na Pátria, é hora de regressar ao há-des ver. Um especial obrigado a ti, Malena.