Chegaram assim. Sem aviso. Numa plácida e queda Quinta-feira. Máquinas, tubos, pedras, camionetas e camiões, tractores, contentores e afins. Tudo aqui à frente de casa. Tudo aqui na "praceta", tudo aqui na "quinta".
O burburinho cedo começou. Que se passa? Que se passará? Que vão fazer aqui? O mistério adensava-se à medida que os dias iam passando e cada vez se via mais parafernália. Gente... nada. Veio o fim-de-semana. Nada.
Veio a Segunda, veio a Terça, a seguir a Quarta e a Quinta... nada.
Veio a Sexta. E com ela cartazes. "Obra a cargo da Junta de Freguesia". Por baixo um desenho técnico das obras que se iniciariam e que todos foram ver. Uns juravam a pés juntos que seria um jardim. Outros garantiam que aquilo era um fontanário. Outros um parque infantil. Outros, mais cautelosos, aventavam que seria "uma merda qualquer".
Uma semana e meia depois começavam os trabalhos.
Com uma precisão mecânica suiça, impreterivel e impressionantemente, chegavam todos os dias entre as oito e meia e o meio-dia menos um quarto. Ao meio-dia paravam.
Dois africanos, um magrebino e um europeu de leste.
Se chovia, paravam os trabalhos para se abrigarem da água.
Se estava sol, paravam os trabalhos para se abrigarem dos mortíferos raios solares.
Se estava nublado, paravam os trabalhos para se abrigarem da depressão.
Feliz ficou o dono do café da esquina que no período da manhã começou a aviar não só os sempre monótonos cafés, mas as fresquinhas "mines" que saiam ora à cadência dos raios de sol ora à cadência das gotas de chuva. Ou disfarçadas na bruma.
Muitas vezes também os quatro trabalhadores viam-se forçados à incrível e cruel injustiça de terem que levantar o recto do tabique e correrem(!!!) para a obra porque vinham os 8 coletes amarelos que por uma hora os cercavam. Dois representantes da Junta, um representante da Cãmara Municipal, um arqueólogo, um engenheiro, o "dotôr", um fiscal camarário e um tipo que ainda que com colete amarelo e capacete enterrado nos cornos, nunca fez outra coisa senão estar ao telemóvel.
A coisa durou 7 semanas.
Na oitava semana apareceu a grande placa: "Passadeira Central".
Pois foi. Dois meses e uns valentes milhares de Euros depois, surgiu uma passadeira/lomba de proporções himalaicas em calçada e alteração dos parqueamentos. A "passadeira central" liga nada a coisa nenhuma. Nem os cães lá passam. Perderam-se mais de 15 lugares de estacionamento. O camião do lixo já não consegue passar. O camião da reciclagem já nao vem. Os carros mais baixos batem no asfalto se vão a mais de 3 Km/h.
Mas estamos muito mais felizes. Podemos morrer em paz.
Temos uma passadeira central.